A greve: para os colegas que me leem às escondidas

Os amigos solicitam a minha presença nos jantares. Quando acaba a greve?, perguntam. Alguns colegas interpelam-me sobre o assunto "até onde é que isto vai", porque sentem e ouvem que a situação está a ficar insustentável para quem nunca se sentiu confortável na adesão. A minha mãe precisa de cuidados e questiona-me sobre se "o que estamos a fazer" ainda vai durar. Os alunos encontram-me na rua e perguntam-me pelas notas ou escrevem-me diretamente sobre o assunto. A minha vida está em suspenso: coisas a tratar nas finanças, carta para o senhorio, médicos, dentista, arrumações em casa, escrita, milhares de tarefas que surgem por obra do demo da inquietação. 
Não sei quando acaba a greve. No que depender de mim, embora exausta, não acaba enquanto não vir satisfeitas as reivindicações dos professores. Porque  não cede o ministério? Bem, porque no momento em que ceder ao que pedimos, terá de ceder em muitos outros flancos, a muitas outras classes. A vitória dos professores será um rombo para o governo. Por isso é que é importante não ceder, esquecer os tostões e manter a chama acesa. Precisamos do apoio da opinião pública: dos pais, dos alunos, dos amigos, de todos os que estão de fora. É muito difícil manter a resistência ao longo de tantos dias, sobretudo sentindo que os outros pensam para si "estás a lutar para nada" ou "isso é apenas uma luta vossa, estou só aqui a ver". Indigna-me senti-lo. Não estou a lutar para mim. Sou dos que menos sofrerá com isto. Não tenho filhos nem casa própria, portanto não tenho cadilhos. Tenho uma mãe ainda viva (minha única "prisão"), e de resto sempre fui muito móvel e vivo com pouco. Passo a vida a dizer que durante 10 anos da minha vida tive todos os meus bens numa mala debaixo das camas por onde dormia. Luto porque esta é uma causa de todos, de máxima justiça laboral. A minha luta fará a diferença, no futuro, para os vossos filhos. Não sou uma pessoa materialista, não me interessa qualquer tipo de riqueza que não seja a da justiça e a da paz. Por isso preciso do apoio de todos. Precisamos do apoio da nossa família, dos nossos amigos, vizinhos, colegas. Preciso que quem gosta de mim, que quem acredita em mim transmita esta mensagem. Por favor, não digam "eles estão lá na luta deles". Nós estamos numa luta enorme, com consequências vastíssimas.
O salário que me será descontado vai fazer muita diferença, mas vendo os anéis para continuar a assegurar o básico. Uma coisa é certa, e esta mensagem vai sobretudo para os meus colegas hesitantes, que me leem às escondidas e me olham fugazmente na escola: não podemos desistir de uma luta com estas dimensões porque nos vão faltar 100 ou 200 euros no final do mês. As consequências de uma desistência são muito graves. É preciso continuar indefinidamente com a greve às avaliações. Não pode haver notas para o 12º enquanto não houver recuo do ministério. Não interessa se as férias terão de ser adiadas, embora estejamos todos trancendentemente cansados. Não se está numa batalha com o rabo de fora. Acreditem no que estamos a fazer. Não desistam porque a batalha vai longa. Já travei batalhas mais longas e difíceis e sinto orgulho por ter resistido e vencido. Tenho a convicção de que vencemos sempre as batalhas em que acreditamos. Se estamos juntos, que motivo há para ter medo? Não aprendemos todos na escola primária essa útil mensagem dos livros do Estado Novo: que a união faz a força?!

(Para os meus amigos que não são professores nem funcionários públicos: esta luta também é, indiretamente, em vosso benefício e dos que convosco estão relacionados (ascendentes e descendentes), por isso não me perguntem quando acaba, como se fosse um empecilho. Eu não estou desaparecida, mas empenhada, e preciso de descansar para conseguir continuar. Embora esteja de greve às avaliações, continuo a trabalhar todos os dias ao ritmo normal de quem faz vigilâncias de 3 horas, corrige exames, acaba um ano e prepara outro. E tenho 50 anos. Os 30 ficaram nos anos 90.)

Agradeço ao Paulo de Sousa toda a força que me tem dado desde o início. O seu apoio moral tem sido fundamental.

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